Fanny 100

Fanny Lopes "apenas"

Rui Lopes


Artigo publicado na revista da Hebraica (agosto 2016):

"Fanny Lopes apenas"

É assim que Fanny Gelehrter da Costa Lopes prefere ser chamada. Alta e esguia, ela me espera junto a uma mesa no Café da Sede. Sorri e afirma que não gosta de falar muito do passado.

"Então, vamos falar de hoje", digo e sorri.

"Tive quatro filhos, oito netos e seis bisnetos, meu neto mais velho tem 40 anos, são chegados, me entendem. Todos são lindos, cada um tem uma coisa boa para mim," enfatizando o "são chegados".

Fanny tem a visão muito reduzida, fala dessa limitação e como a resolveu:

"É uma doença na retina, vejo os rostos esbranquiçados, mas uma lupa eletrônica amplia bem as letras e projeta as páginas dos livros na tela da TV, um achado da minha filha Ruth. Tiro fotos com meu ipad, uso o skype, me sinto um pouco escra-va pois passo horas assim, ouço todos os noticiários. Acompanho tudo, mas tris-te. É preciso saber o que se passa à minha volta", explica Fanny.

Em seguida, fala alegremente:

"Estou ocupada, tenho muitos amigos, eles me visitam, eu os visito".

No dia-a-dia, trata do jardim de casa, telefona para os filhos e amigos, entra "rapidamente" na cozinha e capricha para sair. Ela conta que as noras Miriam e Susana eram sócias da Hebraica e ela, convidada. Sorri:

"Aqui nadei! Adoro a água, o sol. Foi um luxo. Em vez de comprar uma jóia, comprei um título de sócia. Me sinto tão feliz por vir aqui".


Detalhe: Fanny, tem 92 anos, mora em Perdizes e vem de taxi ao clube.

 "Há épocas em que venho todos os dias, outras vezes menos, porque estou ocupada. Para mim o tempo significa alguma coisa para fazer. Gosto dos salva-vidas, sou bem re-lacionada, me ajudam a encontrar uma raia, para mim é importante estar sozinha para não bater de encontro com as pessoas. Gosto de nadar porque nesses momentos me sinto livre, não vejo deficiência, vejo azul".

Quando não vai à piscina dá dez voltas na pista, varia os restaurantes, vê um dos netos.

"Fico contente de vir aqui e conversar com as pessoas. Essa convivência é gratificante. Gosto de viver. É bom".

Fanny nasceu em Berlim, em 1923, filha de judeus russos. Com o nazismo e o início da Segunda Guerra, ela, o pai e a irma foram para a cidade do Porto, em Portugal. A mãe morreu muito jovem. Aos 15 anos, Fanny conheceu o agrimensor Acilio da Costa Lopes. Casaram e foram morar em Angola, na África. Em 1962, vieram para o Brasil. Vinte anos depois, Acilio faleceu de repente.

Fanny adora trabalhar: foi professora no Yázigi, lecionou dez anos alemão para os funcionários da Volkswagen e mais dez na Mercedes, até o 75° aniver-sário. Ainda dá aulas de conversação e literatura em casa, pois gosta de "bolar ideias novas para os alunos".



Outros Projectos